Prazo para autorreconhecimento de Comunidades Tradicionais de Fundo e Fecho de Pasto é debatido em Juazeiro
A Lei nº 12.910/2013, sancionada
pelo Governo do Estado da Bahia, determina que Comunidades Tradicionais de
Fundo e Fecho de Pasto têm até o dia 31 de dezembro de 2018 para se
autorreconhecerem e entrarem com o pedido de certificação na Secretaria de Promoção
da Igualdade Racial (Sepromi).
A menos de seis meses da data
limite - um dos pontos mais questionados desta legislação - representantes de
comunidades tradicionais de 12 municípios dos Territórios Sertão do São Francisco e Piemonte Norte do Itapicuru
e de entidades que apoiam a luta dos Fundos e Fechos de Pastos se reuniram,
para discutir a questão.
O encontro, realizado no Centro de
Formação Dom José Rodrigues, em Juazeiro, teve início com a construção de uma
linha do tempo sobre o movimento dos Fundos e Fechos de Pasto no sertão baiano.
Estas comunidades, que ocupam territórios tradicionalmente há várias gerações e
vivem principalmente da criação à solta de animais e da agricultura familiar,
passaram a ter seus modos de vida ameaçados a partir da década de 1970, com a
grilagem de terras de uso coletivo. Na linha do tempo, os/as participantes
destacaram os conflitos que atingem essas comunidades há mais de quatro
décadas, mas também as resistências, mobilizações, conquistas e organização
popular destes grupos.
Com a aprovação da Lei nº
12.910/2013, novos debates foram surgindo, a exemplo da proposta do governo
baiano, que apresentou um contrato limitado de concessão de direito real de uso
das terras coletivas, muito questionado pelas comunidades. A lei impõe um prazo
para que todas as comunidades registrem para o estado o autorreconhecimento
como Comunidade Tradicional de Fundo e Fecho de Pasto. “A gente entende que é
muito ruim quando as comunidades têm que ter um prazo para dizer que é Fundo de
Pasto”, reclama Valério Rocha, da comunidade Melancia, em Casa Nova. De acordo
com ele “tem muitas comunidades que vivem no sistema de Fundo de Pasto, mas
ainda não se organizaram para buscar o autorreconhecimento”, complementa.
Durante a formação foi relatado que muitas comunidades sequer sabem dessa
exigência imposta pelo governo.
Atualmente, existem mais de 1.000
comunidades que têm características de Fundo ou Fecho de Pasto, mas, apenas cerca
de 700 comunidades se autorreconhecem enquanto comunidade tradicional e 374 estão certificadas.
A certificação é considerada como positiva pela Articulação Estadual de Fundo e
Fecho de Pasto, entretanto, o prazo estabelecido na legislação é visto como
inconstitucional e uma ameaça à existência destes povos.
De acordo com o Advogado Carlos
Eduardo Chaves, da Associação de Advogados/as de Trabalhadores/as Rurais da
Bahia – AATR, "a Constituição Federal não prevê nenhum prazo para que as
comunidades venham se identificar e pleitear seus territórios tradicionais, que
são fundamentais para a manutenção desse modo de vida”. Isso, segundo Carlos
Eduardo, torna o prazo para autorreconhecimento inconstitucional, explica o
advogado.
A assessora jurídica do Instituto
Regional da Pequena Agropecuária Apropriada (Irpaa), Beatriz Cardoso, e o
integrante da AATR, Carlos Eduardo Chaves, que facilitaram o encontro,
explanaram sobre os direitos das Comunidades Tradicionais de Fundo e Fecho de
Pasto, no tocante à reprodução da cultura e modos de vida, garantidos por
instrumentos como a Constituição Federal, a Convenção nº 169 da Organização
Internacional do Trabalho (OIT) e a Constituição do Estado da Bahia. Os
advogados também trouxeram elementos acerca de uma Ação Direta de
Inconstitucionalidade (ADI) que está tramitando no Supremo Tribunal Federal
(STF) e trata sobre o prazo determinado na Lei nº 12.910/2013.
ADI 5783
A partir de uma denúncia da
Articulação Estadual de Fundo e Fecho de Pasto a respeito do prazo para o
autorreconhecimento e certificação das comunidades tradicionais, previsto para
o próximo dia 31 de dezembro, junto aos procuradores da República Edmundo Antônio
Dias Netto Jr. e Wilson Rocha Assis, o então procurador-geral da República,
Rodrigo Janot, propôs, em setembro de 2017, a Ação Direta de
Inconstitucionalidade (ADI) 5783. Uma ADI tem como objetivo declarar que uma
lei ou parte dela é considerada inconstitucional, ou seja, contraria a
Constituição Federal.
A ADI 5783 está em tramitação no
STF sob a relatoria da ministra Rosa Weber, que não considerou o prazo
inconstitucional. No entanto, a ADI ainda seguirá para votação no STF.
Texto: Comunicação CPT Juazeiro e
Comunicação do Irpaa
Fotos: Comunicação CPT Juazeiro
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