A EX- IRMÃ GLEISE E OS ÍNDIOS: NO EMBATE ENTRE INDÍGENAS E O AGRONEGÓCIO GOVERNO FEDERAL MOSTRA DE QUE LADO ESTÁ
Quero ser freira – ela disse. Já havia até escolhido a Congregação: a das Irmãs Franciscanas Bernardinas, com sede no Rio Grande do Sul. Isso foi em 1979, quando tinha 14 aninhos e vivia em Vila Lindóia, bairro de Curitiba. O pai Júlio, apavorado, brecou o ingresso da filha no convento. Não fosse isso, a Pastoral Indígena contaria hoje com a militância da irmã Gleisi, que teria acumulado experiências e conhecimentos capazes de conferir legitimidade ao discurso sobre problemas relacionados aos índios.
Mas ela renunciou à sua vocação e, agora, sepultou definitivamente os ossos daquela freira natimorta que simpatizava com a teoria da libertação, que depois, já no PCdoB, militou no movimento estudantil, que foi presidente da União Metropolitana dos Estudantes de Curitiba e que aderiu ao PT. Pariu, em seu lugar, alguém que, embora desconheça por completo os problemas indígenas, pontificou nesta semana sobre o tema como se fosse refinada especialista. O corpo é o mesmo da ex-quase-futura freira, mas outra é a alma que traiu os princípios pelo qual lutou no passado.
A alma é da ministra da Casa Civil, Gleisi Helena Hoffmann, que não resistiu às pressões dos ruralistas na sessão de quarta-feira da Comissão de Agricultura da Câmara. Durante mais de seis horas, eles atacaram a Funai e exigiram a suspensão dos processos de demarcação de terras indígenas. Ao invés de defender o governo federal, ao qual pertence, ela afinou seu discurso com os ruralistas, aderiu a eles, anunciou que vai alterar as regras de demarcação e encaminhou ao Ministério da Justiça pedido para que no Paraná – seu reduto político – nenhuma terra indígena seja identificada, delimitada ou demarcada.
Desta forma, Gleise Hoffman, atropelando o Ministério da Justiça, engrossou a campanha orquestrada recentemente em todo o território nacional pelo agronegócio, que de um lado, no Congresso Nacional, busca atentar contra os direitos constitucionais dos povos indígenas e, de outro, açula a população, atiçando e incitando a opinião pública contra os índios.
Desta ofensiva radical faz parte a tentativa de instalar uma CPI da Funai proposta pelo deputado Moreira Mendes (PSD-RO, vixe, vixe) com o objetivo de questionar os critérios usados nas demarcações. Criaram um Movimento Contra a Demarcação da Terra Guarani de Morro dos Cavalos (SC) que fez camisetas com a inscrição “CPI da Funai Já!”. Reuniram mais de mil empresários, alguns domingos, outros afifes, que aos gritos de “Demarcação, não. Sim à produção”, interromperam com vaias discurso da presidente Dilma em Campo Grande (MS).
O objetivo é criar pânico em determinados setores da população, semeando desinformação para retirar a simpatia com a qual parte da opinião pública vê os índios, como vem ocorrendo em Santa Catarina, onde o agronegócio continua divulgando que se a reivindicação dos índios em Morro dos Cavalos for acatada, entre 5.000 a 10.000 guarani virão do Uruguai, Paraguai e Argentina “para ocupar terras do Brasil”. Eles apelam para o terrorismo midiático:
- “Quanto vale a sua propriedade? Sua liberdade? O seu sonho? A água pura que você bebe? A mata o meio ambiente que o cerca? O marisco que você cria? Você vai ficar omisso e perder tudo isso?” – diz o panfleto anônimo que circulou na região, provocando ódio e hostilidade contra as comunidades indígenas.
Digamos que isso não é nenhuma novidade, pois esses cretinos agem assim desde Pedro Álvares Cabral. O novo, aqui, é o fato de eles receberem, agora, apoio da ministra da Casa Civil e de outros setores do governo federal que, por lei, devem defender a Constituição vigente, cujo artigo 231 obriga a demarcação das terras tradicionalmente ocupadas pelos índios. O mais estarrecedor é que o Partido dos Trabalhadores, no poder, empreste seu nome para tal empreitada.
- Não podemos negar que há grupos que usam os nomes dos índios e são apegados a crenças irrealistas, que levam a contestar e tentar impedir obras essenciais ao desenvolvimento do país, como é o caso da hidrelétrica de Belo Monte”, denunciou a ex-quase-futura freira, Gleisi Hoffmann, sem dizer que grupos são esses e porque são irrealistas suas crenças.
De que adianta votar num programa do PT, que pretende defender os desvalidos, os deserdados, os lascados, de que adianta eleger a Dilma se quem acaba governando são os ruralistas e o agronegócio? Por que alguém com a biografia de luta da ex-quase-freira aceita fazer esse jogo político sujo, puxando o saco de ruralistas?
- Ela age com interesse eleitoral. Interrompe a demarcação para fazer a vontade dos fazendeiros que vão financiar sua campanha, afirma documento da Articulação dos Povos Indígenas da Região Sul, lembrando que Gleisi Hoffmann é a provável candidata ao governo do Estado do Paraná, em 2014, e que quando se candidatou ao Senado, em 2010, recebeu R$ 390 mil de empresas ligadas ao agronegócio.
Atenção, paranaenses sensíveis e solidários com aqueles cujas terras vem sendo saqueadas e expropriadas há cinco séculos! Quem financia as campanhas eleitorais são eles. Mas quem vota somos nós. Não esqueçam disso em 2014. Gulegulê.
Por Ribamar Bessa Freire
Fonte: D24AM
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